Capítulo 2 - Do início da emigração aos imigrantes da primeira fase. (1)

A primeira remessa de emigrantes feita pela C.ia Imperial de Emigração.

O relatório do ministro Sugimura.

Em chegando ao Brasil para assumir seu posto como ministro-residente da Legação, no ano de 1905, Fukashi Sugimura foi abordado em colóquios que teve com o presidente e o ministro da fazenda a respeito da questão imigratória. O próprio estado de São Paulo, que Sugimura visitara como parte do cronograma oficial, parecia alimentar grandes expectativas em relação ao trabalhador japonês.

Em junho do mesmo ano, Sugimura produziu tão depressa quanto possível um relatório, que mais tarde seria enviado ao ministério, onde contava sobre sua viagem por São Paulo e detalhava quão promissora era a possibilidade de se introduzir o imigrante japonês naquele estado. Sugimura esperava que, ao ler o tal relatório, todo o país voltasse os olhos em direção à América do Sul. Pode-se imaginar a motivação do ministro sabendo-se que o relatório foi enviado em várias partes, cada qual em um navio diferente, pois o ministro temia que ao enviar o relatório completo de uma só vez o atraso provocado pelo correio marítimo fosse deveras grande.

A repercussão do relatório.

O relatório foi publicado pela primeira vez em dezembro de 1905, no boletim da secretaria do comércio do Ministério das Relações Exteriores (“Tsūshō isan”), e depois republicado no periódico Ōsaka Asahi Shimbun no fim de ano. A repercussão foi grande; tantos foram os pedidos de informação, vindos das mais várias aldeias e cidades, que o Ministério viu-se forçado a imprimir um certo número de respostas-padrão com os dizeres: “por encontrar-se ainda em fase de pesquisa, não podemos emitir um parecer em relação à emigração para o Brasil”. Ao ler o artigo no jornal, o superintendente da recém-fundada C.ia Imperial de Colonização [Kōkoku Shokumin-gaisha], Ryō Mizuno, não tardou em dirigir-se à Legação Brasileira no Japão e ao Ministério das Relações Exteriores, e em dezembro do mesmo ano, viajou para o Brasil. Ryō Mizuno não foi o único que dirigiu-se tão depressa para o Brasil após ler a notícia no jornal (Ryō MIZUNO, Nambei tokō annai [Guia de viagem para a América do Sul]); entre os que aproveitaram o ensejo, estava o jurista da província de Kagoshima, Saburō Kumabe, que trouxera a família consigo.

O contrato com a C.ia Imperial de Colonização.

Ryō Mizuno, da C.ia Imperial de Emigração, viajou para o Brasil com escalas no Peru e na Argentina. No percurso, Mizuno conheceu um jovem chamado Teijirō Suzuki, que pretendia trabalhar nas minas de salitre no Chile. Mizuno convenceu-o a acompanhá-lo até o Brasil, e os dois chegaram a São Paulo em abril de 1906. Com o auxílio da Legação Japonesa no Brasil, Mizuno pôde avistar-se com as autoridades do estado, mas o contrato não chegou a ser assinado por conta de impedimentos legais. Em julho de 1906, Mizuno deixou Suzuki numa fazenda de café para que o jovem pudesse adquirir alguma experiência prática, e voltou ao Japão em seguida. Mizuno retornou ao Brasil em 1907, depois que as leis que impediam a entrada de imigrantes japoneses houvessem sido modificadas, e a assinatura do contrato se deu em 6 de novembro do mesmo ano, em conjunto com o secretário da agricultura, Carlos Botelho.

O contrato estabelecia que:

  1. a C.ia Imperial de Colonização deveria recrutar um total de 3 mil imigrantes-família para trabalhar nas fazendas de café do Brasil dentro de um prazo de 3 anos. Os imigrantes deveriam ser remetidos até o porto de Santos, sendo que a primeira leva (composta por mil indivíduos) deveria chegar no mês de maio de 1908;
  2. o governo brasileiro assumia o pagamento das 10 libras da passagem de navio, devendo os fazendeiros que contratassem os imigrantes restituir-lhe 4 libras retiradas do salário dos imigrantes.

A exigência por imigrantes-família deve-se ao fato de que o governo brasileiro não desejava imigrantes do tipo decassegui, e sim imigrantes que permanecessem por bastante tempo nas fazendas. Até então, somente emigrantes solteiros haviam sido recrutados para o trabalho no ultramar, o que tornava difícil o recrutamento de famílias inteiras. Mizuno tentara persuadir o governo a abrir mão dessa cláusula — em vão. Em suas memórias, anos mais tarde, Mizuno conta que o governo brasileiro teria dito a ele que “conseguisse qualquer coisa parecida com famílias”, e que tudo teria terminado aí.

A aprovação do Ministério das Relações Exteriores.

Com o contrato selado, Mizuno tratou de retornar depressa ao Japão — aportou em Yokohama em janeiro de 1908 —, tentou conseguir rapidamente a aprovação do Ministério das Relações Exteriores, mas a cláusula que previa a remessa de emigrantes-família revelou-se um empecilho. Diante da impossibilidade de se reunir o número desejado de famílias até maio daquele ano, o Ministério reivindicou mais seis meses de prazo para fazer a remessa, mas o pedido foi negado pelo ministro-residente Uchida, que disse “não ser a situação apropriada para adiamentos” e pediu cada província facilitasse a expedição do atestado que comprova os vínculos familiares entre os emigrantes até maio daquele ano.

O recrutamento dos emigrantes.

A C.ia Imperial de Emigração obteve a permissão para recrutar novos emigrantes, por fim, em fevereiro de 1908. Como não fosse possível embarcar todos os emigrantes até março e fazê-los chegar a Santos até maio, foi solicitado ao governo do estado de São Paulo que prorrogasse o prazo até o mês seguinte e os candidatos precisaram ser selecionados às pressas.

O recrutamento processou-se com a ajuda de representantes de cada província, mas somente 781 emigrantes haviam sido recrutados até o final de abril (600 homens e 181 mulheres, além de 12 espontâneos). A maior dificuldade foi reunir famílias inteiras de emigrantes, sendo muitas delas “compostas” — ou seja, casamentos de fachada e parentescos inventados.

Somente aqueles que possuíam bens (e que podiam contrair dívidas, portanto) puderam juntar o pecúlio necessário para bancar os custos da viagem e inscrever-se. Dos inscritos, 325 eram de Okinawa, 172 de Kagoshima, 78 de Kumamoto, 77 de Fukushima e 42 de Hiroshima. Dentre os inscritos, muitos sequer eram agricultores; havia: inspetores de polícia, policiais, condutores de trem, professores, sacerdotes e tipógrafos.

Convém dizer que, à época, o desejo de emigrar para o Brasil não era tão grande quanto o de emigrar para o Havaí ou os Estados Unidos, embora fosse maior do que em relação ao Peru.

Tabela. Despesas com o traslado (por pessoa).
Preparativos cerca de 20 ienes
Gastos com selos, carimbos etc. 1 iene
Comissão 25 ienes
Passagem de navio até Santos 60 ienes (para maiores de 12 anos)
Exame médico, vacinação e higienização 2,75 ienes
Remessa da bagagem cerca de 0,50 ienes
Pernoite antes do embarque cerca de 3 ienes
Reserva 20 ienes
Passagem de trem até o local de embarque  
Total ¥ 132,25 + passagem de trem
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