O invencível Conde Koma que desafiou a luta contra a Amazônia
O “Gracie Jiu-Jitsu”culminou também nas cenas das artes marciais mistas do Japão no final da década de 1990.
Este nome foi fortemente marcado graças à actividade do Rickson Gracie e irmãos Gracie do Brasil nas lutas das artes marciais mistas realizadas sob as regras do “vale tudo”. Este era um estilo de imagem antiquado vindo da palavra “jiu-jitsu” e de luta real bem diferente em relação ao atual judô que se tornou um esporte. O fato de o jiu-jitsu, que possui a mesma raiz do judô na Kodokan, ter evoluído de uma maneira completamente diferente em outro mundo, ou Brasil, surpreendeu os fãs de artes marciais.
A maioria, exceto alguns fãs fanáticos em artes marciais, não sabem que ao buscar as origens do Gracie Jiu-Jitsu, pode ser encontra um imigrante japonês chamado Mitsuyo Maeda, também conhecido com o apelido de Conde Koma. As realizações da vida de Maeda eram grandes e ele era mais do que fundamental para o desenvolvimento do Gracie Jiu-Jitsu.
Maeda nasceu como o filho mais velho de um rico fazendeiro em 1878 na vila de Funazawa localizada no condado de Nakatsugarugun da prefeitura de Aomori. Quando era garoto, já carregava facilmente 2 fardos de arroz e exibia sua força em competições de sumô realizadas em santuários xintoístas.
Em 1896, ele deixou o Aomori ken Jinjo Chugakko ( equivalente à escola secundária padrão da prefeitura de Aomori na época) durante o segundo ano letivo e foi para Tóquio praticamente fugindo de sua casa e entrou na escola secundária de Waseda que acabara de ser fundada. Ali, teve o seu primeiro encontro com judô e matriculou-se no Kodokan no ano seguinte.
No final do ano seguinte, ele derrotou os aprendizes mais velhos, prestes a pegarem faixa preta, durante a luta de três partidas que era realizada mensalmente entre os aprendizes sem o dan (sem a faixa preta), onde terminou com 10 vitórias seguidas. O nome do Maeda passou a ser famoso dentro do Kodokan a partir deste momento. O Maeda se matriculou no Tokyo Senmon Gakko ( Escola profissional de Tóquio e atual Universidade de Waseda) e subiu até o terceiro dan em 1901, desde então iniciou o ensino de judô na escola Gakushuin e Escola de cadetes do exército.
Ele era presença ilustre até mesmo dentro do Kodokan, e por analogia com o fato de os melhores discípulos instruídos diretamente pelo Jigoro Kano já serem conhecidos como "Kodokan Shitenno" (quatro maiores seguidores do Kodokan), o Maeda passou a ser conhecido como um dos "Kodokan Sanba Garasu "(três aves pilares da Kodokan) juntamente com o Shota Todoroki e Kaichiro Samura, representando os líderes da próxima geração.
Em 1907, um dos membros de Kodokan Shitenno, o Tsunnejiro Tomita foi enviado aos Estados Unidos (anotação1) para divulgar o judô e justamente. Maeda estava na melhor época da sua condição física, e foi escolhido para acompanhar o Tomita que já havia passado do pico da sua melhor época. Para o Maeda que sempre vivia falando do seu sonho de sair do Japão e "atravessar ao continente eurasiático para se tornar um rebelde montando cavalo ou um pirata", este foi um convite realmente irrecusável.
Os dois começaram a divulgação do judô na costa leste dos Estados Unidos, dando demonstrações de kata e partidas de lutas em Academia Militare dos Estados Unidos e na Universidade Columbia, recrutando novos alunos. Nas partidas de lutas, Maeda venceu grandes jogadores de futebol americano e professores de ginástica que vendo o Maeda de 164 centímetros de altura e 68 kg de peso, com estatura nada grande mesmo para um japonês da época, tinham pensado que poderiam facilmente derrotá-lo, usando a sua imensa força do quadril e técnicas de projeção para devolver as forças dos oponentes contra eles e vencê-los. Estas atividades e a vitória do Japão na guerra contra os russos em 1908 causaram o crescimento da fama do Japão e jiu-jitsu, contribuindo com o recurtamento de discípulos. No entanto, se foi devido ao desconforto de ser jogado, ou o tédio dos exercícios repetitivos, somente poucos desses novos discípulos permaneceram. E ainda, outra fonte de preocupação do Maeda e sua companhia era o fato de que alguns japoneses queriam aproveitar a fama da época e fingiam serem lutadores de judô, mas acabavam sendo derrotados miseravelmente após o duelo desafiado pelos lutadores de wrestling em várias regiões.
O Maeda permaneceu na costa leste dos Estados Unidos, separando-se do Tomita que transferiu suas atividades para a costa oeste, e para resolver tais problemas publicou anúncios em jornais para aceitar ativamente os desafios vindos de lutadores e organizou lutas abertas. Maeda queria que os americanos vissem o verdadeiro judô e ao mesmo tempo divulgar a sua eficácia no combate real.
A primeira luta pública era contra um lutador profissional chamado The Butcher Boy, que era um gigante de 182 cm e 113 kg, mas o Maeda aplicou técnicas de projeções como o Tomoenague e Uranague já na primeira parte, onde conseguiu o pinfall e na segunda parte aplicou chave de braço e conseguiu uma vitória perfeita. Este era a memorável primeira luta de artes marciais mistas que iniciaria a sua jornada pelo mundo a partir deste momento. Pelo fato de ser luta de artes marciais mistas, a regra mudava a cada partida,e em alguns caso em que o uso de judogui (roupa para luta de judô) era proibido, Maeda tinha de lutar seminua como em uma partida de wrestling, mas a lenda diz que ele nunca perdeu as 1.000 lutas em que vestiu o judogui.
Maeda continuou dedicando na divulgação do judô em várias regiões dos Estados Unidos realizando lutas abertas, porém as atividades de divulgação não geraram resultados esperados e Maeda deixou os Estados Unidos em 1907, e se mudou para a Inglaterra.
Na Inglaterra, o judô já era conhecido e, diferente dos Estados Unidos, ele conseguiu discípulos dedicados ao abrir uma academia. Ele também realizou palestras e lutas abertas em várias regiões assim como o fez em Estados Unidos, participando também de campeonatos de wrestling que estava tornando-se popular na época. Durante estas partidas ele também lutou pela primeira vez contra um boxeador, onde venceu a luta. A tática adotada por ele foi de proteger o rosto e a boca do estômago e abaixar-se, enquanto movia-se rapidamente contra o oponente para pegar a sua perna, derrubá-lo e finalizar o seu braço, o que demonstra que a origem da tática de luta utilizada pelo Gracie jiu-jitsu no vale tudo já havia sido formada nesta época.
nica e França, ele também foi convidado para a Espanha, onde nasce o seu outro nome, o “Conde Koma”. Quando o Maeda entrou em Barcelona, ele viu um anúncio sobre uma palestra a ser realizada por uma pessoa que dizia ser o campeão japonês de judô, mas esta era a pessoa que o Maeda também conhecia e não era de maneira alguma, uma pessoa com habilidade suficiente para ser chamado de campeão. Então, decidiu dar-lhe uma lição e resolveu chamá-lo para uma luta utilizando outro nome, para que a pessoa não descubra que o seu oponente seria o Maeda e não fuja da luta ao saber disso. Ele não conseguia imaginar um nome bom e também estava sem dinheiro nesta época, portanto reunindo estes fatos ele primeiramente pensou em utilizar o nome “Maeda Komaru” (“Komaru” representa em japonês uma situação em que“está com problemas”). No entanto, ele utilizou somente o “Koma” deste termo e colocou a palavra “Conde”do espanhol na sua frente, nascendo assim o nome “Conde Koma”. O Maeda desafiou uma luta como Conde Koma, mas o oponente logo percebeu que seu adversário era o Maeda e fugiu da luta. No entanto, graças à esta lição, este indivíduo parou de chamar a si mesmo de campeão de judô. (Sekai oko judo musha shugyo)Após a Europa, Maeda foi para a América Central e América do Sul. As demonstrações de artes marciais também eram populares em Cuba e México, onde o público ficava entusiasmado quando via o pequeno Maeda dominar facilmente os lutadores gigantes e isto formou a sua grande popularidade. Após isso, ele foi para Guatemala, Panamá e deixou a América Central para entrar no continente da América do Sul, onde seguiu a costa pacífica e visitou o Peru, Bolívia, Chile, Argentina , Uruguai e chegou no porto de Santos em 1914, onde pisava pela primeira vez a terra do Brasil. Após ensinar judô na academia naval por um período, ele seguiu para o norte no ano seguinte onde acabou chegando na foz do rio Amazonas e também na terra em que permaneceria o resto da sua vida, a cidade de Belém. Maeda havia sentido na sua pele os movimentos anti-japoneses durante as suas atividades em Estados Unidos, e ao longo de suas viagens e lutas pela América Central e América do Sul, passou a procurar naturalmente por uma segunda terra que aceitasse o desenvolvimento de japoneses. E ao ter o contato com a grande natureza da Amazônia, a bela cidade de Belém construída no estilo europeu e na generosidade do povo local, ele teve a certeza de que ali era a terra que procurava. A partir daqui, inicia-se a segunda parte da vida de Maeda.
Quando o Maeda chegou, a cidade de Belém estava no meio da festa de 300 anos de colonização e um destes eventos era o campeonato de luta livre para decidir o maior herói da Amazônia. O Maeda participou deste campeonato sem o agendamento prévio, mas acabou levando a vitória. As histórias de sucessos das atividades realizadas pelo “Conde Koma” em vários locais da América Central e América do Sul já haviam chegado também na terra da Amazônia, mas quando o povo de Belém presenciou a sua força e atitude educada, recebeu o Maeda com olhar de respeito. Ao mesmo tempo em que ensinava o judô nas academias policiais e militares, ele iniciou o recrutamento de discípulos para o seu dojô(academia), onde as celebridades locais e seus filhos se matricularam um atrás do outro. O empresário escocês Gastão Gracie também passou a pedir o ensino de judô para seu filho Carlos (anotação2) que estava na idade da rebeldia. O Maeda também utilizava seus conhecimentos de seitai(técnicas de terapia manual) e realizava massagens sob visita domiciliar, o que permitiu a sua integração com a alta sociedade de Belém, e passou a ser chamado de “Professor Conde Koma”,tornando-se uma pessoa líder dos japoneses.
Durante este período ele visitou também Cuba e México e realizava frequentemente lutas públicas em Belém também, mas em 1922, quando ele estava com idade acima dos 40 anos, decidiu terminar as suas atividades como lutador e passou a trabalhar seriamente com projetos de colonização da Amazônia. Quando foi hospitalizado em 1924 por um problema com os rins, ele conheceu a Daisy May Iris, uma enfermeira inglesa, que era muito gentil com ele e se casou com ela, com quem passou a adotar sua filha, a Celeste.
Como se estivesse sincronizado com estas atitudes do Maeda, o Japão também revisou a Política Emigratória que até então estava concentrada para o estado de São Paulo, e passou a estudar a Amazônia como nova terra promissora para colonização. Em adição, o estado de Pará também estava prestes a entregar a esperança de desenvolvimento das áreas intocadas da Amazônia na mão dos japoneses. Quando o membro contratado do Ministério das Relações Exteriores, o embaixador para o Brasil e a equipe de investigação da Kanebō visitou a Amazônia, o Maeda que já tinha se tornado pessoa influente perante os funcionários de alto nível de governo do Estado, voluntariou-se ativamente como um guia e explicou com entusiasmo o potencial da Amazônia.
Após isso, o próprio Maeda tornou-se um membro contratado do Ministério das Relações Exteriores e quando a Sociedade Colonizadora da América do Sul foi estabelecida para realizar a colonização política governamental na Amazônia, ele passou a exercer a função de auditor da empresa de serviço local. Além disso, quando a Sociedade Produtora da Amazônia foi criada por Tsukasa Uetsuka e outros, o Maeda foi nomeado diretor e foi incansável na realização de negociações com o governo do Estado e na ajuda aos colonos.
No entanto, ao contrário dos pensamentos do Maeda, os japoneses que tentaram a colonização e desenvolvimento de terras da Bacia Amazônica, enfrentaram grandes dificuldades. Maeda recebia em Belém os colonos para a Amazônia, e enviava-os para a colônia animando-os com a frase “não voltem”, mas após algum tempo muitos viam o sonho destruído e acabavam voltando. Neste momento, o Maeda demonstrava rosto triste e gesto de irritação, mas no final acabava levando-os para a sua casa onde oferecia refeição e ajudava-os a encontrar trabalho em Belém, o que acabou virando a sua rotina.
Após estabelecer a sua moradia em Belém, o Maeda dedicou torno de 20 anos ao projeto de colonização da Amazônia, no entanto ao longo do tempo a sua doença renal tornou a voltar, e em novembro de 1941, sem nunca ver o desenvolvimento da Amazônia, ele faleceu após 63 anos de vida.
Em seu funeral, todos os carros de Belém formaram fila desde a cidade de Belém até o cemitério para se despedirem do caixão. Após viajar para os Estados Unidos com Tomita, o Maeda nunca voltou a por os pés em sua terra natal novamente. Depois que se tornou quase um embaixador privado em Belém, ele foi encorajado a voltar ao país pelo governo do Japão. Ele havia se recusado a seguir todas as sugestões mesmo sentindo saudade da sua terra natal. Ninguém pode dizer se o motivo era que o projeto de colonização na Amazônia com o qual ele tinha sido muito entusiasmado estava longe de ser completa, ou que ele considera os sentimentos de sua família que viviamno Brasil, ou não.
Na carta particular enviada por Maeda em 1930, havia descrição das seguintes palavras.
-É claro que a colonização não terá os seus frutos de sucesso em poucos anos, portanto acredito que chegará um dia em que o meu corpo estará no túmulo, permanecendo apenas os ossos brancos e meus companheiros imigrantes que prosperaram, dirão que o túmulo do japonês Maeda - Conde Koma deve estar por aqui e irão encontrar com suas mãos o pequeno túmulo coberto de musgos. Quando esse dia chegar, a minha alma permanecerá eterna e estará imensamente feliz em ver a realização da minha crença.
Após 5 anos de falecimento do Maeda, teve-se o início do sucesso de cultivo da pimenta-do-reino em Tomé-Açu a partir da muda de pimenta trazida pelos japoneses, que por sua vez gerou um sucesso econômico sem precedentes para a Amazônia.
anotação1 | Antes disso, Yoshiaki Yamashita, um dos "Kodokan Shitenno" (quatro maiores seguidores do Kodokan), tinha viajado para os Estados Unidos e ensinou judô ao presidente dos Estados Unidos, Theodore Roosevelt. |
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anotação2 | Após receber os ensinos do Maeda durante 4 anos, mudou-se para Rio de Janeiro em 1925, onde fundou a academia Gracie jiu-jitsu junto com o seu irmão mais novo Hélio e outros membros da família. |